quarta-feira, 2 de julho de 2014

Dieta&Fitnes - Desconstruindo paradigmas

O post de hoje é de interesse de muitas pessoas mas o fiz pensando nos meus colegas de profissão (nutricionistas) e profissionais da área da saúde e esporte em geral. Gostaria que todos os profissionais refletissem e repensassem sobre seu papel na vida de seus clientes/pacientes, visto o enorme alcance das informações.

Fiquei simplesmente chocada ao selecionar estas figuras! Além de carregar mensagens equivocadas, são destrutivas. Estas imagens foram retiradas de algumas páginas de nutrição e fitness e/ou por alguns profissionais (nutricionistas, personal trainers) nas redes sociais e definitivamente NÃO contribuem para uma alimentação e hábitos saudáveis!

Conceitos errados sobre alimentação e atividade física são tidos como “corretos”, “normais”, “SAUDÁVEIS”! Restrição alimentar, compulsões alimentares em dias programados, encarar a atividade física como algo penoso e obrigatório, monotonia alimentar, alimentos da moda, estereótipos, depreciação do corpo, preconceito, ridicularização de pessoas em detrimento da aparência – são alguns exemplos e NADA disso é saudável!
  • Textos e imagens pejorativas NÃO motivam ninguém. Quem ama cuida, certo? Então como uma pessoa ridicularizada vai querer cuidar de si?

  • Criam uma ilusão acerca do "corpo perfeito". O que é o corpo perfeito? O que é um elefante com corpo perfeito? Brincadeira! Pior do que isso: este elefante estaria representando algo do item anterior, digamos, pejorativo. Logo um indivíduo magro (frango) ou com sobrepeso ou obesidade (elefante) não têm corpos perfeitos, certo? Pra quem? Pra quê? 


  • Reforçam a dicotomização (separação) entre alimentos “saudáveis” e “não saudáveis”, “bons” e “ruins”.

Eu nunca vi uma pessoa na rua com batata frita pendurada no quadril... Onde será que elas moram?
  • Transmitem a ideia de que alimentos se transformam automaticamente em gordura corporal. Se fosse assim, seria fácil acabar com a desnutrição no mundo!


  • Se tudo que comêssemos se transformasse em gordura, tampouco funcionaria comer de maneira saudável (colocarei o conceito já já) e fazer atividade física para a saúde e controle de peso corporal. Sendo assim, seria coerente nem tentar mudar, certo?


  • Extrapolam o conceito de “alimentação saudável” ao associar alguns alimentos/produtos (frutas, legumes, verduras, batata doce, frango, whey protein) a indivíduos magros e/ou musculosos e outros (fast food, doces) a indivíduos obesos.


  • Extrapolam o conceito de saúde ao considerar saudáveis obrigatoriamente apenas os indivíduos magros e/ou musculosos e não saudáveis indivíduos com sobrepeso, obesidade e de peso naturalmente abaixo do "ideal". Aumento de massa muscular adquirido com alimentação equilibrada e atividade física é o ideal, mas nada garante a não utilização de anabolizantes, assim como nada sabemos sobre a genética, metabolismo, hábitos alimentares ou estilo de vida de alguém que está acima do peso.

A obesidade, ao contrário do que apontam os estudos, não é multifatorial, ela é causada pelo "gene da preguiça". Cômico.

  • Associam erroneamente peso e/ou forma do corpo com caráter – Obesos são “sem vergonha”, “preguiçosos”, "fracassados"? Então obesos não podem ter um relacionamento bem-sucedido, não podem ter sucesso financeiro, ter um bom emprego, não podem dançar bem, não podem se vestir bem, não podem ser considerados bonitos – por causa da forma do corpo?

Então quer dizer que uma pessoa que desenvolveu câncer, por exemplo, não tem vergonha na cara? Fiquei confusa...

  • Incitam o sentimento de culpa.


  • Associam o conceito de beleza somente a corpos magros e/ou musculosos.



  • São contraditórias.

Na mesma página que encontrei isso...

Encontrei isso.
  • Ter como único objetivo de vida um “corpo perfeito” – que nunca existirá, porque quando o objetivo é alcançado, ele nunca basta ou não é reconhecido pelo próprio indivíduo. Só para deixar claro, podemos não ser "imunes" à insatisfação corporal. O problema é que ela pode vir acompanhada de distorção da imagem corporal (e gera essa questão do não reconhecimento das mudanças por parte do indivíduo) e também depende da nossa postura em relação esta insatisfação (podemos achá-la "ok", modificar o que desagrada ou não, ou seja, aceitar, e independentemente da escolha seguir a vida, ou podemos viver em função daquilo que incomoda, o que é altamente destrutivo).


  • Encaram transtorno dismórfico corporal de maneira “natural” e/ou cômica.



  • Reforçam a ideia de que atividade física só serve para "queimar calorias", "esculpir" o corpo, "construir músculos" ou emagrecer. Não há problemas em ter um objetivo ao escolher uma atividade física, mas onde ficam o prazer, a saúde e o bem-estar nessa história? Fora que o conceito de "ficar bem" é subjetivo e pode ser uma armadilha (de acordo com a figura anterior, "ficar bem" parece ser inatingível e é justificado na fala "preciso treinar mais").

É só isso?
  • Utilizam somente partes do corpo (glúteos, abdome, bíceps) como motivação – dane-se chegar aos 80 anos com força para subir escadas, carregar sacolas, fazer as atividades diárias com autonomia, ter saúde e pique para brincar com os netos, dançar, sair com os amigos... E ainda ignoram o potencial genético - todo mundo que faz atividade física fica necessariamente "sarado"? 

Eu quero ter a altura da Ana Hickmann, pode ser ou tá difícil?!

  • Incitam o terrorismo nutricional. Ignoram o fato de que o ganho ou perda de peso é reflexo da qualidade da alimentação como um todo (não da ingestão de apenas 1 tipo de alimento), da quantidade ingerida, da frequência e outros fatores já citados (ambientais, culturais, sociais, econômicos, genéticos, metabólicos, endócrinos, psicológicos, fisiológicos).


  • Consideram normal e "importante" planejar um dia da semana para ter compulsões alimentares, o famoso "dia do lixo". A Pirâmide Alimentar, um guia nutricional para uma alimentação saudável (validado e baseado em estudos) mostra que todos os grupos de alimentos podem ser consumidos diariamente nas porções recomendadas, não havendo necessidade de tirar um dia para comer tudo o que você sentiu vontade de comer durante a semana e não comeu!

1 - Ele não está comendo lixo (vejo pizza, panqueca, bolo, mas lixo não)
2 - Essas coisas não eram de "gordo"?
3 - Então quer dizer que essas coisas não vão engordá-lo automaticamente ou grudar no seu quadril, hã?
  • Trazem mensagens equivocadas sobre alimentação saudável.


Então o que é uma alimentação saudável?
A definição de “alimentação saudável” de que mais gosto é esta, da nutricionista norte-americana Ellyn Satter:

“Alimentar-se normalmente (de forma saudável) é ser capaz de comer quando você está com fome e continuar comendo até você ficar satisfeito. É ser capaz de escolher os alimentos de que você gosta e comê-los até aproveitá-los suficientemente – e não simplesmente parar porque você acha que deveria.

Alimentar-se normalmente é ser capaz de usar alguma restrição na seleção de alimentos para consumir os alimentos certos, mas sem ser tão restritivo a ponto de não comer os alimentos prazerosos.

Alimentar-se normalmente é dar permissão a você mesmo para comer às vezes porque você está feliz, triste ou chateado ou apenas porque é tão gostoso. É também deixar alguns biscoitos no prato porque você pode comer mais amanhã ou então comer mais agora porque eles têm um sabor maravilhoso quando estão frescos.

Alimentar-se normalmente é comer em excesso às vezes e depois se sentir estufado e desconfortável. Também é comer menos de vez em quando, desejando ter comido mais. Alimentar-se normalmente é confiar que seu corpo conseguirá corrigir os errinhos da sua alimentação.

Alimentar-se normalmente requer um pouco do seu tempo e atenção, mas também ocupa o lugar de apenas uma área importante dentre tantas da sua vida. Resumindo, o “comer normalmente” é flexível e varia em resposta às nossas emoções, nossa agenda, nossa fome e nossa proximidade com o alimento.”

Bem diferente da foto, né?

Não!
Para finalizar, que tal aproveitar o momento de Copa do mundo e estimular as pessoas a buscar uma atividade física prazerosa? 

A prática de alguma atividade física é muito importante – auxilia na prevenção de doenças cardiovasculares, redução dos níveis de colesterol, normalização da glicemia (açúcar no sangue), prevenção de alguns tipos de câncer, manutenção da massa óssea, manutenção da massa muscular e força, promove o bem-estar, auxilia no combate à depressão, etc. São muitos os benefícios.

Nada contra quem pratica musculação, fisiculturistas, atletas... O problema não é este. Aliás, musculação é uma das opções de atividade física, por que não? Mas não existe só esta opção.

Futebol, basquete, natação, hidroginástica, dança, caminhada, atividades ao ar livre, pular corda, queimada, pilates, patinação, escalada, yoga, bambolê (lembra?), skate, pedalar, ginástica olímpica...

Não desista se você ainda não encontrou uma que é a sua cara. Existe uma infinidade de outras esperando por você ;)




8 comentários:

  1. Gostei da postagem. Legal ver gente que tenta pensar e se posiciona diferente das ondas não apenas pra ser do contra ou aparecer mas com embasamento. Não gosto da necessidade que as pessoas têm em se meter e julgar a vida dos outros que é o que acontece com essas imagens. Acho válido incentivar as pessoas a levar uma vida saudável e não acho que seja mentalmente saudável viver com tantas paranoias.

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  2. Legal, todo esse seu discurso, mas eu já fui obesa pesava 120kg e consegui emagrecer 40 kg sem cirurgia bariatrica apenas com dieta e exercicios e vc vai me disculpar mas não acredito nessa balela de tudo que quiser moderadamente, tenho 30 anos hj, por toda minha vida segui essas furadas propagadas aos quatro cantos e a unica coisa que eu conseguia era emagrecer no máximo 7 kg pra depois engordar 10, tinha um corpo péssimo (pra mim era), 37% de gordura corporal, calças tamanho 54, falta de folego, dores no corpo todo, joelhos e coluna destruidos pela obesidade, depressão e ainda tinha que ouvir apelidos carinhosos como Jabulani, baleinha, gorducha e achar bom. Há 3 anos atrás quando eu decidi mudar meu estilo de vida, excluir quase todas as besteiras que eu comia e manter um rotina de disciplina com minha dieta e exercicios pelos quais hj sou apaixonada, eu consegui atingir meu objetivo, antes eu comia de tudo um pouquinho, era obesa, triste, tinha vergonha até do meu marido, Hoje não dependo mais de biscoitos e chocolates para ter felicidade, meu maior prazer é ter disposição o dia todo, me olhar no espelho e me sentir bem, poder estar com meu marido a qualquer hora, inclusive durante o dia, correr com meus cachorros sem estar bufando depois de 3 minutos, sair para onde eu quiser sem vergonha do meu corpo e ter pique pra dançar a noite toda, hoje eu tenho o que se chama qualidade de vida!!! Nunca estive tão feliz, me vejo mil vezes melhor com 30 do que quando eu tinha 15 anos, e para quem quer mudar de vida fica dica, experimente mudar de vida e de habitos e acreditar menos nessas balelas, faça o teste da mesma forma que eu fiz, permita-se por 30 dias mudar de vida, faça esse sacrificio por vc!

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  3. Parabéns pelo texto. Tem meu pleno apoio! ;)

    www.naosouexposicao.wordpress.com

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  4. Excelente o texto! Faz muito sentido para mim... Sou uma dessas pessoas que tinha uma alimentação saudável, um organismo equilibrado, um peso estável, uma relação bacana com a alimentação, vida social... E que de repente trocou tudo isso por dietas atrás de dietas, perda de peso, problemas de saúde e muito sofrimento!
    Sei que vou levar anos para amenizar toda a bagunça que fiz no meu metabolismo, com chance de nunca voltar a tê-lo como era... Por quê? Quis ser "fitness". Me tornei bulímica, anorexa, doente.

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  5. Fiquei encantada com seu texto! Concordo plenamente, e fico triste quando vejo esse monte de "imagens motivacionais" na internet, que de "motivacionais" não tem muito né!
    Também amei o conceito que você trouxe de alimentação saudável!

    Beijos

    sobretranstornosalimentares.blogspot.com

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    1. Obrigada, Nathália!

      Também li seu blog, muito bom! Parabéns!

      Beijos!

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  6. Piramide alimentar está baseada em estudos INCONCLUSIVOS e passíveis de reavaliação pelos estudos atuais. Atualmente as dietas (que não são exatamente dietas, pois devem ser seguidas para sempre) de baixo carboidrato ou chamada paleolítica estão sendo usadas para emagrecimento e para TRATAMENTO de doenças metabólicas. Gostei do teu site, mas sugiro muito estudar as recentes pesquisas no PubMed sobre efeito de abordagem low carb. Tem muito pano pra manga no blog do médico José Carlos Souto. www.lowcarb-paleo.com.br . Quem se anima a ler tudo, é uma revolução na nutrição, e pior, muitas coisas são tão óbvias que não nos damos conta. Abraço e muita carne gorda!

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    1. Prezado,

      Todos os estudos atuais são passíveis de reavaliação, uma vez que a ciência é dinâmica.

      Concordo plenamente que indivíduos doentes têm necessidades nutricionais específicas e precisam seguir planos alimentares individualizados. No entanto, o blog é destinado ao público geral e estas considerações são baseadas na premissa de que pessoas saudáveis devem seguir uma "dieta" saudável, devem e podem comer todos os tipos de alimentos, em uma quantidade compatível com suas atividades, preferências, valor aquisitivo, disponibilidade, etc, e diariamente.

      Além disso, muitos estudos recentes mostram que dietas restritivas podem resultar em obsessão por comida, compulsões alimentares, ganho de peso e gerar transtornos alimentares em indivíduos geneticamente predispostos (e como saber quem tem predisposição a desenvolver transtornos alimentares se raramente os próprios profissionais da saúde não colhem este dado em suas anamneses? Perguntam sobre colesterol, glicemia, peso, DCNT, mas negligenciam, muitas vezes, as doenças mentais). Transtornos alimentares são cada vez mais comuns na prática clínica e, embora a prevalência seja muito mais baixa em relação às doenças crônicas, as consequências podem ser devastadoras não só para os pacientes, mas também para familiares e amigos.

      Não tiro o mérito deste tipo de pesquisa, acho valiosíssimo inclusive para o fim que você descreveu, mas acredito que a nutrição pode ir além dos aspectos biológicos, existem outros fatores tão importantes quanto a serem considerados.

      Abraço.

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