sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Desmitificando as Dietas da Moda – Dieta Detox (Desintoxicante)




Todo começo de ano é a mesma coisa – muitas pessoas querem saber mais sobre a dieta detox, outras nem querem saber já vão pedindo mesmo, há uma enxurrada de cardápios desintoxicantes na internet, nas bancas, nos caixas dos supermercados, tudo pra tentar “correr atrás do prejuízo”, pra passar uma borracha nos excessos das festas de fim de ano. “Esse ano vai!” ou “Vou começar o ano fazendo tudo direitinho!”. Será que começar o ano fazendo dieta é sinônimo de “fazer tudo direitinho”? 

O que é a dieta detox?

É a ingestão de alimentos e/ou líquidos com o objetivo de eliminar toxinas do corpo, acumuladas pela má alimentação (consumo excessivo de alimentos industrializados e/ou agrotóxicos, bebidas alcoólicas) além de noites mal dormidas, stress, excesso de sol, etc.
Essas toxinas não seriam excretadas adequadamente pelo fígado e rins e ficariam acumuladas no corpo.

Na dieta detox estão excluídas as carnes (peixe, aves, frango, porco, boi), ovos, leite e derivados, trigo (pães, massas...), açúcar, adoçante, cafeína e bebidas alcoólicas. Fica permitido o consumo de água, frutas, verduras, legumes, leguminosas (feijões), oleaginosas (castanhas, nozes, amêndoas...), grãos e sementes.

Geralmente a dieta detox tem curta duração (2 a 10 dias) e tem uma fase de dieta líquida.

O que promete?


Promete “limpar” o corpo (toda vez que leio isso imagino uma pessoa que tenha engolido uma vassoura... hahaha, desculpa!), eliminar toxinas, reduzir retenção de líquidos, melhorar o humor, o aspecto da pele, unhas e cabelo, eliminar gordura, etc.

Os contras...

1- Não concordo com o nome “dieta desintoxicante” porque não concordo com suas premissas.

Intoxicação alimentar é sinônimo de doença transmitida por alimentos (DTA), que é causada por 3 tipos de perigos:

  • biológicos (bactérias, vírus, fungos, etc)
  • químicos (produtos do metabolismo das bactérias, produtos de limpeza, etc)
  • físicos (poeira, terra, pelos de animais, cabelo, etc)

Sabe aquele bolo maravilhoso cheio de chantilly que você comeu em uma festa, que ficou horas exposto sem controle de temperatura adequado, que te fez passar mal? Pois é, ele devia estar contaminado por bactérias (perigo biológico), e/ou pelas secreções dessas bactérias (perigo químico) e/ou foi infectado pelo manuseio inadequado de quem preparou o bolo, com as mãos sujas, ou o cabelo (perigo físico), que levou essas bactérias ao chantilly do bolo.

O resultado disso é catastrófico, não é? Geralmente há dores abdominais, náuseas, vômitos, diarreia, febre, dores, mal estar geral e por aí vai.

Isto é uma intoxicação alimentar.

Inchaço, retenção de líquidos pelo consumo excessivo de sal ou outro tipo de alimento, me desculpe, mas é melhor inventar outra desculpa!

2- Ok. Também pode haver intoxicação por químicos que não sejam produtos do metabolismo de micro-organismos. Por causa disso podem surgir outros tipos de sintomas (e não, não insista, não estou falando de inchaço...).

De todos os males referidos como pretexto para iniciar uma dieta detox, considero importantes o álcool e os agrotóxicos (pesticidas). Até aí, segundo a definição apresentada, ambos são perigos químicos, concordo!

Mas estas questões podem ser resolvidas sem a necessidade de fazer uma dieta restritiva. O nutricionista, por diversas questões, não pode recomendar o consumo de bebidas alcoólicas. Que tal conscientizar o paciente que tem o hábito de beber a reduzir e/ou cessar o consumo ao invés de receitar uma dieta rígida pós-bebedeira? A terapia nutricional deve priorizar a mudança de hábitos, ao passo que dietas de gaveta dão a impressão de ser um corretivo provisório com prazo de validade vencido.

Além disso, os órgãos de um indivíduo normal (sem doenças), conseguem metabolizar e excretar o álcool em algumas horas, não tem como o álcool se acumular no sangue por dias, meses...

Sobre evitar os agrotóxicos, acho ótimo, mas que tal incentivar o consumo de alimentos orgânicos no dia a dia? Outra opção é acompanhar a lista de alimentos mais afetados pelo uso abusivo de agrotóxicos e evitar seu consumo. (Também pouco adianta fazer as receitas da dieta detox com alimentos que transbordem defensivos agrícolas, não é mesmo?)


3- Procurei nas bases de dados Scielo, PubMed e bvs (Biblioteca Virtual em Saúde) e não encontrei artigos científicos que sustentassem a necessidade de “desintoxicar” o corpo periodicamente e/ou após excessos alimentares. Usei as palavras-chave “dieta” AND “desintoxicante”, “dieta” OR “desintoxicante”, “dieta” AND “detox”, “dieta” OR “detox”, “diet” AND “detox” e “diet” OR “detox” e obtive 0 resultados (pesquisa AND, todas as palavras) ou muitas páginas com resultados sem relação ao tema (pesquisa OR, qualquer palavra). Encontrei apenas 1 resultado pertinente no PubMed (busca “diet” AND “detox”), mas a opinião era desfavorável à dieta.

4- Como restringe grupos alimentares importantes como qualquer tipo de carne, ovos e laticínios é incompleta e pode haver absorção insuficiente de nutrientes como ferro e cálcio. Estes minerais podem ser encontrados em alimentos de origem vegetal, mas a absorção é dificultada pelas fibras, taninos e outras substâncias presentes nos vegetais. Além disso, devemos lembrar que muitas pessoas só ingerem o suco coado, e este processo reduz a quantidade de fibras alimentares.

5- Dietas líquidas são difíceis de seguir, são monótonas, comprometem a mastigação e podem comprometer a interação social e o comer emocional, dois aspectos que fazem parte da alimentação dos seres humanos.

6- Não é eficiente porque não promove reeducação alimentar e assim ocorre o efeito sanfona. Após o término da dieta os indivíduos sairão do “modo dieta” e muito provavelmente voltarão aos seus velhos hábitos.

7- Já falamos aqui que a perda de peso de forma rápida é resultado de uma perda de água (massa muscular) e não de gordura. Portanto a promessa de “queimar gordura” é falsa.

8- (de novo) Dietas aumentam as chances de um indivíduo geneticamente predisposto de desenvolver um transtorno alimentar.

Assim como não adianta fazer caldos e sucos com frutas, verduras e legumes cheios de agrotóxicos, nem preciso dizer que também não funciona para aqueles cujo único verdinho do prato é uma folha de alface... Cadê as cores? Cadê os nutrientes?

Concordo que as pessoas se alimentam muito mal – ingerem alimentos industrializados de mais e comida (arroz, feijão, frutas, verduras, legumes, água...) de menos – mas discordo em recomendar somente o consumo de vegetais, excluir grupos de alimentos da dieta ou passar dias à base de líquidos. Não existe um consenso apoiando a necessidade disso e vai contra tudo aquilo que estudei nos 5 anos de faculdade e outros anos de pós-graduação e cursos de extensão.

Incentivar o consumo de sucos (verde, amarelo, laranja, rosa...), sopas diferentes, preparações incomuns é legal, mas como alternativa de variar o cardápio, o preparo e a apresentação de frutas e hortaliças, não como substitutos de refeições.

Referências

Silva Júnior EA. Manual de Controle Higiênico-Sanitário em Serviços de Alimentação. 6ª ed. São Paulo: Varela, 2005.

Marzzoco A, Torres BB. Bioquímica Básica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1999.

6 comentários:

  1. Thaís amei o texto!! Já tentei fazer a dieta detox, dessas de revista mesmo, mas eu não consegui continuar, segui apenas 3 dias... O jeito é aprender a comer direito mesmo. Beijos

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  2. "Como restringe grupos alimentares importantes como qualquer tipo de carne, ovos e laticínios é incompleta e pode haver absorção insuficiente de nutrientes como ferro e cálcio"... Ok, ok... alguém aí precisa conhecer um pouco mais sobre nutrientes. Indico que conheça mais sobre vegetarianismo/veganismo.

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    1. Conheço os nutrientes, mas conheço também algo chamado biodisponibilidade, por isso coloquei a frase seguinte: "Estes minerais podem ser encontrados em alimentos de origem vegetal, mas a absorção é dificultada pelas fibras, taninos e outras substâncias presentes nos vegetais."
      Farei mais pra frente um post sobre dietas vegetarianas. Abraço.

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    2. Sem contar que há mta controvérsia sobre o consumo de soja, um dos principais alimentos utilizados pelos vegetarianos/veganos... Eu não aconselho o consumo de soja da forma como é consumida no Ocidente. Vale lembrar que os estudos do Oriente, a soja é fermentada e não o "resto da soja processada".

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  3. Parabéns! Texto didático, esclarecedor e com excelentes orientações. Estou já compartilhando Thais! Sucesso para você!

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  4. Parabéns Thaís, pela bela publicação, por expressar não somente a sua afinidade por dieta balanceada,harmonica, equilibrada, quali e quantitativamente, assim como é recomendada pelo Ministério da Saúde e corroborada por uma série de estudos.
    Uma pena que nem todos os leigos entendam da melhor forma possível. E desejo aos vegetarianos (todos), que busquem um pouco mais de conhecimento e acompanhamento com um profissional nutricionista, para que se otimize tal dieta (restritiva), pois é mais difícil alcançar as necessidades.

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