Já ouvi muitas vezes a
pergunta “Eu não gosto muito de verduras, legumes e frutas, posso tomar um
multivitamínico?” ou afirmações do tipo “Não sei se o que eu como supre minhas
necessidades, então tomo suplemento”, “na dúvida eu tomo, mal não faz”...
Será que podemos substituir
a alimentação por cápsulas?
Será que precisamos delas?
E será que mal não faz?
Frutas, verduras e legumes
são ricas em vitaminas e minerais, correto? Logo, se há um baixo consumo dos
mesmos, a reposição destes componentes parece muito lógica. Mas e as fibras?
Deixar de consumir estes alimentos é deixar de incluir grande quantidade de
água e fibras alimentares, importantíssimas para o bom funcionamento do
intestino. As fibras também controlam o açúcar no sangue e auxiliam na redução
do colesterol. Outra questão é a da saciedade – comer quantidades adequadas de frutas,
verduras e legumes fornecem poucas calorias e conferem saciedade, importante no
controle do peso. “Então vamos suplementar fibras também!” – Não inventa moda!
Este assunto foi muito
discutido há pouco com a última edição do “Annals of Internal Medicine”, de
dezembro do ano passado, intitulado “Enough is enough” (“Já chega!” em tradução
livre). Nele, basicamente 3 estudos recentes foram discutidos: O primeiro
mostrou que multivitamínicos não previnem câncer, doenças cardiovasculares e
não reduzem a mortalidade. O segundo estudo, com 6000 homens acima de 65 anos,
acompanhados por 12 anos, mostrou que a suplementação com vitaminas não mostrou
melhora no desempenho cognitivo. E o terceiro estudo, de Lamas et. al., mostrou
que a suplementação com vitaminas e minerais não previne eventos
cardiovasculares em indivíduos que já haviam infartado.
O editorial também discute
outros pontos do uso indiscriminado de multivitamínicos e recomendam que estes sejam
evitados, uma vez que seus efeitos são nulos ou prejudiciais. A suplementação
de vitaminas do complexo B, por exemplo, não surte efeito algum. O excesso nós eliminamos
pela urina e isto significa jogar dinheiro literalmente pelo vaso sanitário! Já
as vitaminas A e E em excesso podem ser tóxicas e aumentar a mortalidade e os
riscos de desenvolvimento de câncer. Ou seja... Não existe aquela conversa de
que “mal não faz”.
E essas descobertas não são
novidade. Lembro que meu professor de bioquímica da faculdade, o Bayardo Torres,
já falava de um estudo de 1985, da Finlândia, que mostrou que os fumantes que
receberam vitamina A tiveram maiores incidências de câncer de pulmão.
Uma vez que já falamos dos
riscos e até citei um exemplo de como jogar dinheiro “fora”, outra questão importante
é a da biodisponibilidade de nutrientes. Apesar do palavrão é simples: comer um
alimento, ingerir um nutriente não é garantia de que iremos absorver tudo ou a
quantidade suficiente. De nada adianta ingerir um monte de vitaminas e minerais
se eles competem entre si por absorção! Os minerais cobre, zinco, ferro e
molibdênio, por exemplo, competem por absorção. A vitamina C auxilia a absorção
do ferro mas atrapalha a do cobre. Olhando por esse ângulo tomar uma cápsula
com um monte de coisas já não parece tão interessante, não é mesmo?
“Mas quando Fulano ficou internado
prescreveram multivitamínicos pra ele”. Isto é um caso isolado. Trata-se de uma
pessoa doente com uma ingestão ou absorção ineficiente de nutrientes e que precisa
de uma correção imediata. Isto é diferente de automedicação e não se aplica
para pessoas saudáveis. O melhor caminho é a mudança dos hábitos alimentares.
Referências:
1. Fortmann SP, Burda BU, Senger
CA, Lin JS, Whitlock EP. Vitamin and mineral supplements in the primary
prevention of cardiovascular disease and cancer: an updated systematic evidence
review for the U.S. Preventive Services Task Force. Ann Intern Med. 2013; 159:824-34.
2. Grodstein F, O'Brien J, Kang JH, Dushkes R, Cook
NR, Okereke O, et al. Long-term multivitamin supplementation and cognitive
function in men. A randomized trial. Ann Intern Med. 2013;
159:806-14.
3. Lamas GA, Boineau R, Goertz C, Mark DB, Rosenberg
Y, Stylianou M, et al, TACT (Trial to Assess Chelation Therapy) Investigators.
Oral high-dose multivitamins and minerals after myocardial infarction. A
randomized trial. Ann Intern Med. 2013; 159:797-804.
4. Okigami H. Competição de
nutrientes: um breve comentário sobre suplementos alimentares [Internet].
Disponível em: http://www.cff.org.br/sistemas/geral/revista/pdf/74/15.pdf