terça-feira, 15 de abril de 2014

1 ovo, 2 ovos, 3 ovos... Ôloco!


Estou longe de ser uma expert em assuntos religiosos, mas você sabe de onde veio o coelhinho da Páscoa e seus ovos de chocolate?

Pois bem, para cristãos e judeus a Páscoa representa a esperança de uma nova vida, seja pela crença e celebração da ressurreição de Jesus, seja pela fuga dos hebreus do Egito liderada por Moisés. Como o ovo dá origem a uma nova vida, ele logo se tornou símbolo desta data.

Até aí está fácil de entender. E o coelho?


A simbologia do coelho foi trazida para a América pelos alemães nos séculos XVII e XVIII. O coelho é um animal que se reproduz rapidamente e em grandes quantidades e representa, portanto, o nascimento (de uma nova vida) e a fertilidade, importante num tempo em que a mortalidade era alta.

Nada melhor para fazer a economia girar do que colocar um coelho para entregar ovos na Páscoa! Melhor ainda se forem de chocolate, não é mesmo?

Por muitos anos (e ainda hoje, em alguns lugares) as pessoas presentearam-se com ovos de aves coloridos, decorados. Foram os franceses que, no século XVIII, inovaram ao utilizar uma iguaria muito apreciada, o chocolate, para confeccionar os ovos.

E desde então não se fala mais em outra coisa na Páscoa a não ser no bendito chocolate! Muitas questões são trazidas pelos pacientes, mas o ponto central é o medo de engordar e o medo de “exagerar”... Eu poderia ter me limitado em contar a história do ovo de páscoa de chocolates, mas minha intenção neste post é colocar alguns “pingos nos ís”.
  • Em primeiro lugar não existe alimentos que engordam ou que emagrecem. Alguns alimentos são mais calóricos que outros. O chocolate tem sim gordura e açúcar, mas o que determina se vamos ganhar ou perder peso ao longo do tempo é a quantidade e frequência na qual comemos um determinado alimento.
  • Em segundo lugar, repare que disse em ganhar ou perder peso “ao longo do tempo”. Nenhum alimento é capaz de nos engordar da noite para o dia, senão a questão da desnutrição seria um assunto fácil de resolver, certo? Bastaria um indivíduo com desnutrição comer 1 única refeição ou comer 1 ovo de Páscoa...
  • Terceiro, é comum as pessoas comerem a mais (em comparação aos outros dias “normais” da semana) numa data comemorativa. Normalmente há uma quantidade maior de preparações, ficamos mais tempo à mesa, tem o prato da/do mãe/pai, tia/tio, avó/avô, sogra/sogro, dos vizinhos, amigos... E ainda têm os ovos de páscoa... É mais chocolate do que a maioria está habituada a comer durante a semana.
  • Quarto, precisamos diferenciar comer normal de exagero e compulsão. Atualmente as pessoas estão tão rígidas com elas mesmas que estes conceitos estão todos atrapalhados.

Comer normal


Atualmente a recomendação de chocolate para a população geral brasileira é de 30 gramas por dia. Isto equivale a 1 tablete (4 quadradinhos), ou 1 trufa, ou 2 a 3 bombons, ou um pedaço de 30 g de chocolate, etc.

Tão importante quanto a quantidade é o modo como comemos este chocolate: com prazer, devagar, saboreando, sentindo o cheiro, o gosto...

Muitas vezes o comer normal é encarado como um exagero sobretudo quando trata-se de uma restrição autoimposta: se a pessoa não se permitiu comer nenhum chocolate, comê-lo significa um exagero, visto que 1 (que comeu) é maior que zero (que não devia comer).

E o mais curioso é que uma restrição pode levar a um exagero ou compulsão por adivinha qual alimento? Justamente aquele rotulado como proibido!

Exagero


Não existe um número específico, mágico, que defina um exagero... Podemos dizer que é comer a mais que a recomendação diária para aquele indivíduo? Talvez. Mesmo assim, um exagero é comer a mais do que está habituado, ou seja, é natural, normal em algumas situações, e ainda com prazer!

Depende das características da pessoa (sexo, peso, altura...), da fome, da ocasião (comer social, distração, festas, aniversário, casamento, Natal, Páscoa, casa da avó...).

Com o chocolate, por exemplo, é aquele momento em que comemos mais do que estamos acostumados, mas quando percebemos que passamos da conta conseguimos parar e guardar pra mais tarde, ou para outros dias. Ou quando você está afim de experimentar um de cada, tá curtindo, e quando você vê fala “nossa, é melhor eu fechar isso aqui antes que eu acabe com tudo”.

Exageros alimentares só se tornam problema se forem recorrentes e trouxerem prejuízos à saúde, como colesterol alto, diabetes, obesidade, pressão alta, prejuízos psicossociais, etc.

Compulsão


A definição de compulsão alimentar no DSM-5 é ingestão, em um período limitado de tempo, de uma quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria em um período similar, sob circunstâncias similares, com sentimento de falta de controle sobre o episódio (por exemplo, um sentimento de não conseguir parar ou controlar o que ou quanto se come).

No caso de compulsão alimentar, a pessoa não sente prazer em comer, nem no momento que está comendo, nem depois, porque a pessoa não está desfrutando do momento, saboreando o alimento, está simplesmente devorando. Muitas vezes há sofrimento e constrangimento. E isto não é legal, merece atenção e muitas vezes acompanhamento profissional.

Um exemplo pode ser comer rapidamente e sem saborear todos os (muitos) chocolates que ganhou de uma só vez sem controle, isto é, e não conseguir fechar ou guardar pra depois.

Logo, aquela mesma pessoa não se permitiu comer nenhum chocolate e comeu 2 bombons, de novo, isto não é uma compulsão.


Não deixe que a preocupação e a ansiedade se sobreponham a este momento de reflexão, ou em família. Para os aflitos de plantão, aí vão algumas sugestões:
  • No dia a dia, evite comprar caixas de chocolates e barras grandes. Compre pequenas quantidades de chocolate (um tablete pequeno, ou 1 trufa...) quando tiver vontade.
  • Na Páscoa, caso compre ou ganhe grande quantidade de chocolate, existem algumas opções:

1- Divida com amigos e familiares.
2- Pegue apenas a quantidade que for comer e guarde o resto.
3- Deixe os chocolates/bombons fracionados em saquinhos ou potinhos.
4- Se a vontade de devorar o ovo todo ou a caixa toda for muito grande, guarde em um local de difícil acesso (num armário bem alto, por exemplo), ou no escritório, no trabalho e leve pra casa apenas a quantidade a ser consumida no dia.
  • Lembra do paradoxo francês? Procure comer devagar, sinta o sabor e perceba como derrete na boca. Isso ajuda a satisfazer melhor.

1 ovo, 2 ovos, 3 ovos... Com o preço dos ovos, se você ganhar tudo isso, considere-se sortudo, isso sim!

Boa Páscoa!


Referências:

American Psychiatric Association [Internet]. DSM-V. [acesso em 2014 Apr 14]. Disponível em: http://www.dsm5.org/Pages/Default.aspx

Eating Mindfully [Internet]. [acesso em 2014 Apr 11]. Disponível em: http://eatingmindfully.com


Philippi, ST et al. Pirâmide alimentar adaptada: guia para escolha dos alimentos. Rev. Nutr.,  Campinas,  v. 12,  n. 1, abr.  1999.

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